sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

A vida é simples. O capitalismo é o Apocalipse

Tava aqui pensando em como é fácil viver bem. A receita é simples: ao invés de se concentrar nas generalidades da vida e se decompor no fato de que não controlamos nada do que acontece com a gente, é preciso se concentrar nas práticas. Você sabe que precisa se alimentar bem, ter no mínimo 8 horas de sono, praticar exercícios físicos, cuidar dos afetos, ter por perto quem te ama, guardar dinheiro, viajar, conhecer gente nova, cuidar da casa, das coisas, se manter informado, estudar, ter uma postura reta e dizer com clareza o que tem a comunicar. É simples, vê. Basta se concentrar em adotar tais posturas e praticar cotidianamente as tarefas que se impõem. O problema é o cansaço. O cansaço ferra com todo mundo. No cansaço não se pensa. No cansaço só se quer descansar. No cansaço criamos uma tendência de nos entediarmos e sedemos aos vícios e à raiva. O trabalho assalariado nos cansa. E nos cansa de tal maneira, a nossa mente e corpo, que não conseguimos nem pensar. A tarefa alienante nos tira nossa potência e nos envergonha, nos decompõem. É horrível ser jogado de cá pra lá, e de lá pra cá, sempre concentrado em fazer seu trabalho, se esforçando para poder, no final do mês, pegar, como recompensa, sua quantidade de dinheiro acordada com seu chefe, depois de retirada toda a mais-valia. É preciso fugir do trabalha assalariado o máximo possível. Se é verdade que tempo é dinheiro (e essa é uma máxima ideológica, não filosófica), é verdade também que sem tempo não se gasta o dinheiro. O tempo também se gasta e tem valor. O tempo é o tecido de nossas vidas. Se nós começamos a esticar esse tecido, cada vez mais, a sensação de perda de sentido começa a ficar mais frequente. É a depressão, doença endêmica no século da performance e do empreendedorismo. Sempre tem-se que parar, respirar, e, com calma, pensar seria e honestamente a cerca do que se espera da vida e do que é importante. Priorize as prioridades. Não dá pra jogar uma vida no ralo em nome da ideologia e do medo. O obscurantismo e a ignorância não vai te levar a lugar algum. A competitividade é burra. Não foi competindo consigo mesmo que o Homo Sapiens dominou a savana e se espalhou pelo mundo. Foi, justamente, tendo um espírito de solidariedades e se agrupando em tribos, fundadas no afeto familiar e na cooperação de guerra. O capitalismo é o apocalipse. Corre todo mundo, e salve-se quem puder. Nós conseguimos gerar, artificialmente, um cenário de Jogos Vorazes em nome de ideologia e medo. A gente não presta nem pra se organizar direitinho.

segunda-feira, 16 de setembro de 2019

Trabalho

Que historia é essa de que se merece menos?
Por que alguém mereceria menos?
Não se pode merecer menos se se está disposto e
vivendo.
Não se pode merecer menos se o seu trabalho é importante para a produção de riqueza.
Não se pode merecer menos se necessita de saúde
física e mental para sobrevier, viver e continuar produzindo.

Existe a ideia de que se merece menos pois tem menos responsabilidades. Ora. Se o trabalho é essencial para o funcionamento da empresa. Se é cobrado do cliente a mais pelo serviço que é feito pelo trabalhador, é justo que ele seja remunerado de maneira decente. Os donos de capital tem responsabilidades por que têm, em primeiro lugar, mais liberdade material que os trabalhadores.

O chefe trabalha mais (nas pequenas empresas), mais também é seu trabalho mais cheio de significado, mais engajado e muito melhor remunerado que o trabalhador, que faz uma atividade alienante, que não lhe pertence. Assim o dono do capital tem um ganho duplo: o espiritual e o material.

Para o assalariado resta a alienação, o cansaço, as dívidas, a baixo auto-estima, o estigma da pobreza, a violência da chantagem ("se não quiser tem quem queira") e por aí vai.

Para o dono do capital resta o sentimento de posse, a liberdade material de criar e fazer do seu jeito, o mérito do próprio trabalho, o mérito do trabalho alheio, a boa remuneração, o conforto, a recompensa.

quinta-feira, 16 de maio de 2019

O tempo é o tecido de nossas vidas

Agora que eu não estou mais em uma rotina assalariada tenho uma coisa muito valiosa: o tempo. Posso cuidar do meu corpo, posso ter uma boa noite de sono, posso cuidar da minha alimentação e tenho muito mais calma para os afazeres - o que melhora minha auto-estima e minha saúde mental. O tempo também é útil à reflexão. Pensa bem quem pensa com calma. Engraçado as contradições do capitalismo. Morando com meus pais, abdicando de uma rotina assalariada, eu tenho este direito praticado (que na conjuntura vira privilégio) da calma, do tempo. Se estivesse na rotina do casa-trabalho-casa, construindo riqueza para alguém, sofreria com a ansiedade da pressa, o constrangimento do trabalho assalariado alienado e com a bitolacao da única tarefa. E ainda sofreria, num subemprego, o estigma da pobreza. A única tarefa nos decompõe à medida em que nos cansamos e perdemos desempenho quando estamos, durante muito tempo, num mesmo local, com as mesmas pessoas, os mesmos dramas, as mesmas ansiedades. A diversificação de atividades engajadoras e que exigem auto-disciplina é a chave para uma vida física e mentalmente saudável. É preciso, a despeito da aparente implacabilidade da lógica produtiva da sociedade do desempenho, diversificar atividades despretensiosas e que nos potencializem.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Tempo, dinheiro, sonhos e utopia

Qnd o medo, a ansiedade e a constatação de fraqueza vierem, a tranquilidade será dada como ingenuidade. O tempo é o tecido de nossas vidas. Tempo só é dinheiro pra quem trabalha. Pra quem manda dinheiro é capital, e capital é tempo... dos outros. O medo e a vergonha são duas correntes que prendem o escravo moderno - entre outras correntes, como o cansaço e a falta de tempo. Escravo é aquele que só age coercitivamente. Nesse sentido somos todos escravos num certo sentido. Talvez seja menos escravo quem é mais motivado, ou mais iludido. A realidade não serve ao sonho. E o sonho, mesquinho, tampouco deve se moldar a realidade. O sonho deve morrer. No seu lugar deve surgir a ética e as utopias, que devem permanecer como utopias e não se decomporem na demagogia sectária do medo do fracasso. Só fracassa quem sonha, e a esperança é irmã do medo.

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Sobre o desamparo e a implacável realidade da vida: o movimento

Não existe plenitude na vida. Aquela segurança prometida da infância, que parecia que iria chegar a qualquer momento, e que tudo era uma questão de fazer o que é certo, o que o outro pediu pra fazer, ou o que é preciso ser feito para que o universo te recompense, aquela segurança, agora, parece tão infantil, tão ingenua, não é nada mais que uma ilusão da ignorância. A vida é devir, a vida é uma experiencia, não tem nada nesse mundo que seja como uma finalização, uma plenitude. A vida não é sobre objetivos finais, é sobre sobreviver. Sobrevivência é a unica coisa pela qual nos esforçamos no final das contas (sobrevivência física, mas sobretudo mental e espiritual), o resto é vaidade, caprichos ilusórios, que quando não realizados nos levam à depressão. Felicidade é saúde, é estar saudável, ereto, não aquela alegria vazia que mais me parece desespero.

domingo, 9 de setembro de 2018

Os afetos e a criação cotidiana

Já é sabido o poder dos afetos. Eles nos constituem. É preciso entrar na luta dos afetos, criar os próprios afetos. A luta é semântica e de sentido. É preciso criar sentido e espíritos novos. É preciso criar. Pois sempre há espaço para algo surgir. E algo sempre surge. Se se fica passível diante do tempo, temos menos controle sobre o surgimento, se nos tornamos fazedores e nos engajamos diante do tempo, temos - não mais controle - mas afetamos mais o que está para surgir.

sexta-feira, 18 de maio de 2018

O mal humor, a vaidade, a despotencialização

Existe um jeito de enxergar as coisas que tem haver com a postura incômoda dos mal-humorados. Esse jeito de enxergar as coisas é mais ou menos assim. Vê-se o outro como algo implacável em sua beleza e força. Daí, olhando para si mesmo e se lamentando de não ter nascido forte ou belo, adota-se uma postura dupla: uma auto-depreciação no sentido de se rejeitar, numa despotencialização, numa degradação, e ao mesmo tempo um orgulho dessa força externa que se prova sempre superior. Daí os gostos, os desejos, as vaidades, que sempre vão em direção ao que não é, o que não está. Está sempre incomodado, como se o mundo não fosse perfeito e, não sendo perfeito, não é merecedor do prazer em se viver. Como se essa imperfeição (temporária nesse raciocínio) fosse dar lugar, mais cedo ou mais tarde, à perfeição que traz a promessa de redimir as coisas. Mas essa promessa nunca se concretiza. As coisas sempre estão por fazer, por se concretizar. Não há perfeição no outro. A comparação é uma ilusão, uma projeção platônica das energias internas que não se resolvem devido à repressão. É precisa praticar a empatia com inteligencia, pois é a  própria empatia que nos faz sentir uma ofensa, ou uma rejeição. É justamente porque eu consigo me colocar no lugar do outro que sinto a ofensa tirar uma força de mim, me decompor. É preciso não sentir empatia para com os algozes. Não há algozes, todo o conflito acontece na mente. A vaidade é sempre uma projeção, uma tentativa de se colocar no lugar do outro. A verdadeira empatia não tem a ver com se colocar no lugar do outro, tem a ver com a maturidade de entender que o outro, em alguma medida, sou eu - não por uma identificação narcísica, mas por uma sensatez da convivência, da sobrevivência.